14 de outubro de 2008

O Perfil Psicológico e Criminal




«Se queres compreender o artista contempla a sua obra»


Todas os locais de crimes violentos contam uma história, uma história escrita pelo agressor, a vítima e as circunstâncias únicas da sua interacção. As provas comportamentais deixadas no local do crime podem fornecer dados não só sobre o próprio crime mas também sobre a pessoa responsável por ele (a sua historia pessoal e todo um conjunto de processos psicológicos, afectivos, morais e sociais que o levaram a cometer o crime).

A maior parte dos dados obtidos através do estudo do local do crime, da dinâmica do delito e da própria vítima, tomam forma e se tornam um poderoso instrumento de investigação: o perfil psicológico e criminal.

O complexo processo de elaboração de perfis psicológicos criminais, resultante de um trabalho multidisciplinar e especializado, é definido como “o conjunto de características físicas, psicológicas e sociológicas determinadas como pertencentes ao presumível autor de uma série de crimes, que permite orientar a investigação policial e facilitar a descoberta da sua identidade, detenção e a obtenção de provas que determinam a sua culpabilidade”.

Os objectivos que se pretendem atingir com a sua utilização são, fundamentalmente, quatro: (1) reduzir o número de suspeitos; (2) identificar e relacionar diferentes crimes cometidos pelo mesmo criminoso; (3) desenhar uma estratégia de investigação baseada nos resultados obtidos; e (4) elaborar técnicas de interrogatório adequadas ao detido. 

Este papel deverá ser realizado por alguém (o designado profiler), que deverá possuir conhecimentos periciais, ou seja deverá ter formação em algumas, ou em todas as áreas da investigação criminal, das ciências forenses, da vitimología e do comportamento humano. Este perito deverá ser capaz de analisar provas consistentes e válidas para a investigação criminal e, também, de emitir um parecer contendo o maior número possível de características/dados relativamente a um agressor não identificado.

Cada criminoso tem as suas próprias motivações pessoais, baseadas na sua experiência como ser humano. As motivações da conduta adoptada no local do crime devem ser consideradas tendo em conta a totalidade da conduta e não só aspectos parciais da mesma. Uma vez identificados os motivos e padrões de conduta, pode-se “reconstruir a fantasia do criminoso” e isto pode ajudar a prever os seus padrões de conduta futuros. 

É o comportamento manifestado pelo criminoso no local do crime e não o criminoso em si, que irá determinar o grau de adequação para utilizar esta técnica em cada caso concreto.

Qualquer investigação sobre um homicídio do qual se suspeite que possa ser obra de um assassino em série, começa com a análise exaustiva da cena do crime. Esta análise não se circunscreve à clássica procura de indícios, vestígios e provas forenses presente em todas as investigações de homicídio, senão que abarca outros muitos aspectos e considerações de tipo psicológico baseados nos estudos e na experiência acumulada até à data. Esta técnica baseia-se na teoria de que, na maior parte dos casos, a conduta e a personalidade do criminoso ficam reflectidas na cena do crime da mesma forma que a decoração de uma casa reflecte o carácter dos seus moradores. 

O investigador pode obter valiosíssimos dados acerca do autor dos acontecimentos procurando pautas e tratando de identificar características de personalidade do criminoso, sendo capaz de detectar e interpretar pistas e indícios que pela sua própria natureza não se prestam às tradicionais técnicas de recolha de vestígios: emoções de raiva, ódio, amor, irracionalidade, etc.

Aliando a psicologia às provas materiais obtidas no local do crime, é possível obter um perfil geral acerca do autor do crime. Este processo tem início com uma cuidada análise das provas materiais recolhidas nos locais dos crimes e, todo o tipo de informação obtida através do perfil deve estar comprovada e em consonância com estas provas. 

Actualmente, considera-se que a área do perfil psicológico e criminal obteve notoriedade no domínio do saber científico. No entanto, poucos são os que têm conhecimento sobre o trabalho que é realizado pelos profilers criminais, chegando mesmo a desacreditar o tipo de profissional que se dedica a esta área.

A imagem que usualmente associamos a um profiler criminal é a de um agente do FBI, que já escreveu centenas de livros que relatam a sua experiência enquanto “realizador de perfis”, posteriormente, estes relatos originam a criação de personagens de livros que, por sua vez são transformadas em personagens de filmes, como é o caso do mítico “Silêncio dos Inocentes” (The Silence of the Lambs). Estas personagens também deram origem a diversas séries televisivas tais como “CSI” ou “Profiler”, todos eles inseridos numa leitura anglo-saxónica no que concerne à metodologia de investigação. Desta forma, a publicação da história de “Hannibal” e, de seguida, a sua exibição em filme despertou o interesse nesta matéria.

De salientar que, simplesmente prognosticar as possíveis características do agressor, apesar de ser uma tarefa interessante, será pouco útil se o investigador não for capaz de interpretar os dados resultantes do perfil psicológico criminal, de forma a adapta-los, realçar ou apoiar-se neles para dar uma nova orientação à investigação em curso.

8 de outubro de 2008

A doença de Alzheimer



A doença de Alzheimer foi descrita, pela primeira vez, pelo neuropatologista alemão Alois Alzheimer em 1909. É uma doença degenerativa do cérebro que se caracteriza por uma perda das faculdades cognitivas superiores de forma contínua e irreversível. Ou seja, ocorre uma morte das células cerebrais com uma consequente atrofia do cérebro. Os sinais de alerta desta doença são: a perda de memória, dificuldade em executar as tarefas domésticas, problemas de linguagem, desorientação tanto no tempo como no espaço, fraco ou diminuído discernimento, problemas relacionados com o pensamento abstracto, troca do lugar das coisas, perda de iniciativa, alterações de humor ou de comportamento e na personalidade. À medida que a doença evolui estes doentes tornam-se incapazes de realizar tarefas incluindo as mais simples como as de higiene e de vestir. Deixam de reconhecer os rostos dos familiares, os objectos e, inclusivamente, as palavras. 

Ainda não existe uma causa determinante para esta doença e, de acordo com a comunidade científica, trata-se de uma doença geneticamente determinada, embora possa ou não, ser hereditária. Existem tratamentos farmacológicos importantes, numa fase inicial da doença, que permitem confortar o doente e retardar ao máximo a evolução da doença. Contudo chama-se à atenção para a necessidade dos doentes terem de modificar os seus comportamentos e padrões de vida de forma a possibilitar a sua adaptação à doença. Os familiares e cuidadores constituem pilares fundamentais neste processo de adaptação proporcionando, ao mesmo tempo, uma maior qualidade de vida a estes doentes. A nível da comunicação com os doentes de Alzheimer é conveniente permanecer-se calmo e quieto, falar de forma clara e pausada; devem-se evitar ruídos como, por exemplo, de rádio ou televisão; demonstrar carinho, apoio e tranquilidade, mesmo que o doente não apresente reacção às tentativas de comunicação e expressões de afecto. Deve-se igualmente verificar se possui problemas de visão, audição ou outros. É provável que o doente deixe de reconhecer a necessidade da higiene pessoal. Esta situação não deve ser encarada de forma tranquila e simplificando as tarefas, ou seja, tornar de fácil acesso e de forma ordenada os produtos de higiene, instalar pegas, tapetes anti-derrapantes, assim como outros dispositivos de apoio. Tentar evitar a lavagem parcial. Fazer uma ida ao cabeleireiro para aumentar a auto-estima do doente.

O vestuário do doente deve ser o mais simplificado possível. Este pode ser preparado pela ordem que deve ser vestido, ser restringido a 2 ou 3 conjuntos, a sapatos de enfiar, soutiens de apertar à frente, fechos de velcro (evitar os laços, fechos de correr e botões). Procurar que o doente se encontre sempre bem vestido e elogiar o seu bom aspecto. 

A memória pode ser trabalhada pedindo ao doente para participar e colaborar nas rotinas do dia-a-dia; conversarem não só sobre acontecimentos recorrentes como também de acontecimentos mais antigos com apoio, por exemplo, de fotografias e objectos; participar em actividades do seu interesse. 

É relevante lembrar a importância de dar tempo ao doente, de forma calma e tranquila, para participar nas tarefas ao seu ritmo, sem pressas nem exigências e perfeições. Incentivar continuamente através de elogios, carinho, apoio e compreensão. 

Sempre que necessário procurar apoio junto de técnicos especializados e lembrar sempre que a qualidade de vida constitui um bem-estar físico, mental e social independentemente de se ter uma doença ou não.

Alzheimer



”Tenho 72 anos, meu nome é Maria e o meu companheiro de toda uma vida faleceu há precisamente 1 ano. A dor ainda se mantém viva, mesmo quando os meus próximos mostram-se aborrecidos quando falo dele. Antes de ele falecer, eu repetia com frequência algumas histórias que me aconteciam, principalmente com ladrões, pessoas estranhas que vinham bater à porta, para com esta ou aquela desculpa surrupiarem as minhas posses que, verdade seja dita, não são muitas mas, a televisão onde vejo o folhetim todos os dias e a minha reforma são o meu sustento.

Há uns meses veio cá a minha neta almoçar, eu fico sempre contente quando ela vem, gosto quando a família está por perto as coisas assim parecem mais compostas. Ia fazer bifinhos fritos com batatas fritas, como ela comia sempre que cá vinha mas ela anda com a mania das dietas então quis fazer as coisas ao seu gosto e meti um pargo grande no forno com batatas. Ela chegou, conversamos um bocadinho e sentámo-nos à mesa. Havia qualquer coisa estranha no sabor do peixe. Eu não conseguia diferenciar o que seria… estava bem assado era um bom peixe, fresco, até que ela a medo perguntou: “Avó quantas vezes puseste sal no peixe?” Eu só me lembrei de pôr sal uma vez, mas era verdade o peixe estava salgado!

Outro dia fui à mercearia da Luísa onde vou sempre desde que abriu, quando voltei observei surpreendida que a chave não servia na minha porta, experimentei uma e outra vez, não era possível, até forcei um bocadinho desisti e sentei-me a chorar no vão das escadas, não conseguia perceber o que se estava a passar até que apareceu a minha filha com o meu genro e perguntaram-me que estava a fazer ali e porque não ia para casa. Eu disse que a chave não abria a porta foi então que eles se dirigiram ao andar acima, claro que a chave nessa porta, na minha porta, funcionou!”

O Alzheimer é uma doença degenerativa grave que afecta principalmente mas não exclusivamente indivíduos de idade avançada. A gravidade destas doenças é visível no indivíduo que gradualmente perde as suas capacidades cognitivas: como a memória que apresenta dificuldades em recordar acontecimentos anteriores e dificuldade em memorizar acontecimentos presentes. Surgem complicações ao nível da linguagem, das funções motoras, identificação de objectos e capacidade de execução de tarefas.

“Não sei o que se anda a passar mas há qualquer coisa estranha na forma como me tratam, não me deixam ficar sozinha, acompanham-me quando vou às compras até na cozinha a presença deles é constante. Eu gosto muito que eles se preocupem comigo e façam companhia se bem que parece uma companhia forçada como quando se vigia um prisioneiro. Ás vezes parece que estão a dar-me medicamentos às escondidas para eu não ver, misturados no chá. Há outras coisas estranhas, como quando acordei e estava sentada no quintal ao lado da casota do Snoopy, não sei como fui lá parar e também não contei a ninguém, com vergonha.”

A demência afecta o indivíduo mas também toda a sua dinâmica familiar. Os familiares próximos são obrigados a reconstituírem a sua vida em redor do paciente afectado. É essencial à medida que a demência avança montar um esquema de observação e apoio constante. Uma vez que os pequenos gestos do quotidiano tornam-se grandes barreiras e perigos para o paciente e para os que o rodeiam. Não é raro, mesmo no início da doença o paciente perder a noção do local onde se encontra e esquecer o lugar para onde ia. Estas situações surgem frequentemente em ambientes a que o paciente está habituado como quando vai às compras ao mercado ou ao cabeleireiro. As panelas podem ficar ao lume, torneiras abertas e uma infinidade de situações que pareceriam inofensivas não fossem as falhas nos processos cognitivos que as tornam um perigo eminente.

“Finalmente descobri o que se passa… ouvi os meus filhos a conversarem entre eles, eles pensavam que eu estava no quarto mas ouvi tudo, estavam a decidir se ficavam comigo em casa ou se haveriam de me internar num lar uma vez que essa tal Alzheimer ia ficar comigo de agora em diante. Pelos vistos tem medo de me deixar sozinha e arranjaram-me uma empregada para me fazer companhia e ajudar na limpeza da casa.”