26 de abril de 2016

Imagina-os de cuecas




“Há pessoas desagradáveis apesar das suas qualidades
e outras encantadoras apesar dos seus defeitos.”
 François La Rochefoucauld.







Neste pequeno texto irei tentar conduzir o leitor pelo complexo mundo da ansiedade social, esperando conseguir esclarecê-lo e sensibilizá-lo para uma realidade vivida por muitos.
Perante situações stressantes ou que provoquem ansiedade, é desencadeada uma resposta ansiosa que faz parte do sistema adaptativo de sobrevivência. Já todos nós vivemos alguma situação que nos tenha despoletado nervosismo, tensão e ansiedade, a qual, por sua vez, irá provocar uma reação no nosso corpo. Por vezes experimentamos tremores, sudação, urgência de micção, rubor e outros sintomas somáticos que são respostas adaptativas que remetem aos primórdios da existência humana e que ajudavam à sobrevivência numa era em que o perigo se encontrava ao virar de cada esquina.
A ansiedade desempenha importantes funções quando em pequenas doses, mas se se prolongar no tempo ou atingir níveis elevados pode acarretar diversos problemas. A Ansiedade Social é experimentada em situações sociais, na interação com outras pessoas, tanto hierarquicamente tidas como superiores, como em contextos sociais que envolvam um determinado número de indivíduos. Em casos mais extremos pode levar ao evitamento de determinadas situações sociais e, consequentemente, ao isolamento social.
O receio de ser avaliado negativamente pelos outros, de parecer ridículo, desajeitado, de sentir que não se está à altura de uma determinada situação, ou de ver o seu estatuto social diminuído, desencadeia graus elevados de desconforto e medo, limitando severamente a vida diária de quem sofre deste tipo de ansiedade. Situações aparentemente triviais tornam-se desconfortáveis devido a um estado permanente de vigilância, avaliação e comparação com os demais na tentativa de se protegerem de avaliações negativas pelos outros.
O foco da ansiedade social é o desejo de transmitir aos outros uma impressão favorável de si mesmo, combinado de uma grande insegurança acerca da sua capacidade para o conseguir.
Quando confrontados com situações sociais que os indivíduos com Ansiedade Social interpretam como ameaçadoras ou perigosas são ativados alguns sintomas somáticos e cognitivos, que podem incluir tremor, rubor, taquicardia, sudação, palpitações cardíacas, pensamentos avaliativos negativos, dificuldades de concentração ou “vazio mental”. Por sua vez, estes sintomas podem ser reinterpretados como uma nova ameaça, criando um ciclo vicioso que mantém ou amplifica ainda mais a ansiedade.
Nestas situações interpretadas como ameaçadoras, os indivíduos com Ansiedade Social desenvolvem uma atenção auto-focada, centrando-se na observação e monitorização de si mesmos. Esta atenção tem um efeito intensificador da perceção das sensações corporais, tornando mais consistente e intensificando os sintomas somáticos e cognitivos de ansiedade já existentes. Para além disto, apresenta um efeito de interferência no processamento dos estímulos originados na situação social, levando a que a pessoa processe deficitariamente os sinais de comunicação emitidos pelos outros.
A informação interoceptiva (que é originada no organismo como é exemplo a sudação) intensificada pela atenção auto-focada, é utilizada para criar uma imagem de si mesmo, que assume corresponder ou refletir a forma como os demais o vêem ou pensam acerca dele. Uma pessoa com Ansiedade Social centra preferencialmente a sua atenção nos sinais somáticos e cognitivos da ansiedade que está a sentir, construindo uma imagem (normalmente, negativa e distorcida) de si que assume automaticamente ser a impressão que os outros têm dele.
A Ansiedade Social é, usualmente, acompanhada de comportamentos de segurança que ajudam à sua manutenção. Quando confrontados com uma situação social percecionada como ameaçadora, pessoas com Ansiedade Social tendem a utilizar um conjunto de comportamentos através dos quais procuram diminuir o sentimento de ameaça e ansiedade, bem como o risco de serem avaliados negativamente. Muitas vezes, por exemplo, tentam evitar atrair a atenção para si, verificam ou controlam cuidadosamente o que vão dizer ou evitam o contacto visual.
A possibilidade destas pessoas terem experiências sociais realmente novas e que possam desconfirmar o seu receio de ser avaliada negativamente fica desta forma reduzida, condenando-a à repetição de ciclos interpessoais rígidos que mantém a Ansiedade. Um aspeto, frequentemente, observado na Ansiedade Social é a manutenção do receio de uma avaliação negativa pelos demais apesar das experiências sociais que aparentemente deveriam desconfirmar esse receio, assim como, o benefício limitado que muitos desses indivíduos retiram de exercícios de exposição. 
A Ansiedade Social, normalmente, surge acompanhada pela ansiedade antecipatória e o processamento pós-situação. As pessoas com Ansiedade Social tendem a antecipar uma situação social receada e antever em detalhe o que poderá acontecer nessa mesma situação. Quando iniciam esta antecipação ficam ansiosos e os seus pensamentos são dominados por memórias dos seus fracassos em situações sociais anteriores, imagens negativas de si na situação e pensamentos automáticos de insucesso.
Usualmente, estas pessoas ao tentarem diminuir o receio de avaliação negativa pelos outros, antecipando detalhadamente o que poderá ocorrer na situação social, geram um conjunto de processos cognitivos que vão aumentar a sua ansiedade e contribuir para um funcionamento social pouco eficiente, o que, por sua vez, contribui para a manutenção da Ansiedade Social.
Se a Ansiedade Social diminui habitualmente ao sair ou terminar a situação de interação, as pessoas com esta perturbação descrevem um sentimento de humilhação ou vergonha que persiste por um longo período de tempo após a situação social. Este sentimento de vergonha parece estar associado à tendência para a realização da “autópsia” da situação, revendo com detalhe tudo aquilo que aconteceu na mesma. Apesar do objetivo desta “autópsia” ser o de tranquilizar o receio de ter sido avaliado negativamente, o seu resultado é inverso e a “autópsia” aumenta o sentimento de humilhação e inadequação social.
Na Ansiedade Social são desenvolvidos auto-esquemas, ou seja crenças acerca de si, de ineficácia e inaptidão para lidar com situações sociais e de suposições rígidas e disfuncionais acerca do que deve ser um comportamento social adequado.
Em suma, indivíduos com Ansiedade Social interpretam as situações sociais como ameaçadoras, distorcem negativamente a avaliação do seu desempenho social e avaliam erroneamente, e de forma excessiva, a visibilidade dos sintomas da sua ansiedade pelos outros.
A Ansiedade Social causa um grande sofrimento a quem apresenta estes sintomas, mas com a devida ajuda especializada consegue ser tratada.


Para se poder ser membro irrepreensível dum rebanho de carneiros é preciso,
antes de mais nada, ser-se carneiro.
 Albert Einstein.