16 de maio de 2016

Aprender e brincar entre panelas e fogões





 “É um péssimo cozinheiro aquele que não pode lamber os próprios dedos.”
(William Shakespeare)
Quantos de nós ao recordarmos com ternura um cheiro ou um sabor somos levados de volta para aquela memória doce da nossa infância? O aroma do bolo quentinho da nossa mãe ou avó a sair do forno, o cheiro da panela ao lume, o calor da cozinha que nos aquecia a alma. Ou aquele prato preferido que nos deliciava e nos enchia os olhos, a barriga e, sobretudo, o coração.
Na azáfama da nossa vida, no ritmo acelerado em que ela se reproduz, entre trabalho e rotinas, entre tarefas diárias que não podem ser deixadas para amanhã, deixamos de ter tempo de qualidade para nós e, irrevogavelmente, para os nossos filhos. Fazemos tudo depressa demais, sem parar para sentir e saborear o momento.
Ao usar as palavras “sentir” e “saborear” não as escrevo em vão, talvez por me ser algo tão íntimo, vejo a cozinha como uma aliada na vivência de momentos felizes em família. Pense na sua cozinha! As crianças ficam fascinadas com tudo o que por lá encontram. Um misterioso mundo começa quando as crianças entram por aquela porta: tachos e panelas, recipientes grandes e pequenos, uma interminável amostra de especiarias e utensílios, alimentos de todas as cores e cheiros que lhe enchem o nariz de curiosidade. É talvez o lugar da casa mais apetecível de explorar, onde eles anseiam serem exploradores por conta própria e partir à descoberta de cada recanto daquela divisão que tanto os cativa.
            Já pensou levar o seu filho para a cozinha? Sim, irá precisar de tempo, de uma dose extra de paciência e, certamente, a cozinha irá pedir uma limpeza no final. Faz parte, mesmo com todo o cuidado, haverá farinha que se espalha, leite que se derrama, especiarias pelo chão. Mas a essência da cozinha é isto mesmo, é mexer com as mãos, descobrir novos cheiros, sabores, cores e texturas. É inventar e cozinhar com todos os sentidos que o nosso corpo nos permite ter. Citando William Shakespeare “é um péssimo cozinheiro aquele que não pode lamber os próprios dedos”, e as crianças, inicialmente, necessitam de sujar-se, lambuzar-se, provar e meter a mão para sentir as texturas e descobrir um mundo infindável de sabores. Haverá algo mais irresistível do que o prazer de colocar o dedo na massa do bolo e provar?!
Nunca é cedo nem tarde demais para deixar a pequenada pôr as mãos na massa, especialmente porque cozinhar com as crianças é passarem tempo de qualidade juntos, aprenderem e divertirem-se.
Descontração, paciência, tempo e criatividade são ingredientes essenciais que misturados delicadamente e envolvidos, com uma dose de amor, resultam em deliciosos hábitos para toda a família.
Fortificar a relação com a comida, ensinar o nome de cada alimento e a sua importância, aprender como usar da melhor forma os legumes e a fruta, estar em contacto com novos alimentos incentiva a criança a provar e a criar novos hábitos alimentares, permitindo aumentar e educar o paladar. Além disso ao envolvê-las desde cedo na preparação das refeições, na escolha da receita, na organização dos ingredientes e do material necessário para a sua realização facilita o desenvolvimento de valores como a organização e a responsabilidade.
Entre panelas e fogões as crianças aprendem muito! O tempo passado na cozinha é, em simultâneo, uma escola onde a aprendizagem se encontra agradavelmente disfarçada. As crianças aprendem valores necessários para o seu desenvolvimento psicológico como a autonomia, a autoestima, a concentração, a criatividade, o valor de colaborar nas tarefas e a importância de as realizar até ao fim, desenvolvem a sua destreza manual e permite trabalhar a motivação da criança para o conhecimento, a descoberta, o trabalho em equipa e o saber esperar. Realmente cozinhar requer muita paciência e disciplina: seguir a receita e respeitar as suas instruções, selecionar os ingredientes e os utensílios necessários, esperar que a massa esteja bem mexida e envolvida ou que um bolo coza, ou que arrefeça para ser degustado.
Na cozinha as crianças trabalham e desenvolvem competências imprescindíveis em quase todas as áreas do conhecimento. Aprendem mais sobre a matemática, quando contam ou pesam um ingrediente ou calculam o tempo para o prato ficar pronto. Será uma forma engraçada de aprender a contar ou aperfeiçoar os conhecimentos dos números, medidas e quantidades.
Aprendem mais sobre o português, através da leitura das receitas, que lhes permite praticar e conhecer novas palavras.
Aprendem mais sobre a ciência, ao descobrirem a origem dos alimentos e dos seus benefícios e ao criarem e verificarem como os alimentos se transformam.
Aprendem mais sobre cultura, as receitas são, muitas das vezes, uma viagem pelo mundo e uma forma engraçada de entrar na cozinha de outros povos, abrindo caminho para conversar sobre costumes, tradições, línguas e paladares diferentes.
            O leque de conhecimento que descobrirá é interminável. Quando a criança demonstrar alguma habilidade manual para manipular os alimentos e conseguir compreender e executar instruções, será o momento ideal para os inserir no mundo da culinária.
Comece com receitas pequenas, simples e acessíveis, tendo em conta a sua idade e o grau de exigência. As tarefas devem ser, de forma clara, adaptadas ao desenvolvimento de cada criança e é crucial a valorização das suas capacidades. Os mais pequenos podem lavar a fruta e os vegetais, misturar os alimentos com uma colher como as massas leves ou permita-lhes envolver a fruta e o iogurte, passar os alimentos de um recipiente para o outro com a mão ou a colher, decorar bolos, cortar a massa de bolachas em formas diferentes. Os mais crescidos podem cortar fruta e vegetais, partir e bater os ovos, medir os diferentes ingredientes, misturar os alimentos, barrar os bolos com uma cobertura, ler as receitas em voz alta.
            A cozinha será um recanto onde viverá momentos memoráveis com o seu filho. Coloquem o avental, um chapéu de cozinheiro e desfrutem do prazer de criarem algo juntos.
No fim, elogie muito, partilhem as emoções desse dia e pare, sinta e saboreie o momento.
Retificação: Nos últimos artigos, por lapso nosso, não foram incluídos os nomes das colaboradoras Adelaide Ruivinho e Juliana Martins. Aos leitores e às visadas o nosso pedido de desculpas. P’lo NEIP.