16 de março de 2016

Género (s)- do estigma à aceitação - 2ª parte


Uma elevada autoestima é, por vezes, vital para o desenvolvimento da capacidade de resolver os desafios que a vida apresenta. Na maioria das sociedades e culturas as pessoas que variam dos esquemas de género convencionais são estigmatizadas sendo que as hostilidades que surgem deste estigma podem causar desgaste emocional na criança e dificultar o desenvolvimento saudável da sua identidade. Sem o apoio dos pais, a criança com esta especificidade pode, inclusive, chegar a acreditar que merece ser estigmatizada. De forma a bloquear os efeitos negativos do estigma social, os pais, devem demonstrar uma atitude afirmativa comunicando à criança que a aceitam e a respeitam tal como ela é.
            Como qualquer criança que precisa de amor, aceitação e compreensão, a criança com comportamentos de género variantes porventura necessita destes sentimentos ainda de um modo mais especial. Quanto mais críticos forem os seus pares e a sociedade em geral, mais ela necessita do apoio e da aceitação dos de sua casa e familiares mais próximos. De facto, as crianças são muito mais resistentes e capazes de suportar desafios difíceis quando sentem que os seus pais estão do seu lado numa atitude de apoio incondicional e conscientes dos seus papéis de protetores. Muitas crianças com traços variantes de género passam por isolamento social e sofrem maus-tratos. Em situações limite, o lar pode ser o único espaço onde a criança se possa sentir a salvo das atitudes de censura e de hostilidade. Desta forma, é importante criar uma atmosfera de aceitação em casa para que ela possa expressar os seus interesses livremente. É, de facto, um objetivo interessante começar por trabalhar a sua própria casa como um espaço privilegiado onde esta possa sentir que pode atuar de maneira autêntica sem ter que autocensurar-se para benefício de outrem.
            No que respeita ao enquadramento social e vivencias quotidianas de uma criança com esta especificidade é importante incentivar atividades das quais a criança desfrute e para as quais detém um dom natural não sendo aconselhável forçar atividades que ela sinta como impostas. Deve-se enfatizar que cada pessoa é única e diferente, evitando utilizar frases como “tens que brincar com bonecas”, “jogar à bola é para os meninos”. Em vez de se utilizar generalizações que são falsas, deve-se explicar que, ainda que a maioria das meninas (por ex.) não estão interessadas em futebol, existem meninas que estão e isso não faz mal.
            É importante falar abertamente com a criança e com calma acerca dos seus interesses e comportamentos fazendo com que ela reconheça que é, diferente, em termos positivos. Usar frases como “és única” e conversando de como alguém se pode sentir ao perceber-se diferente dos outros. No entanto, esta criança não pode sentir que é a única no mundo a sentir-se assim. Ajudá-la a compreender que, mesmo que nem todos a entendam ou respeitem, o gostar de coisas diferentes não é motivo para se envergonhar, mas sim uma qualidade única e positiva. Devemos transmitir uma mensagem construtiva e assegurar à criança que quando ela crescer vai ter amigos que irão compartir os seus interesses. Será pois importante cultivar amizade com outras famílias que tenham uma atitude tolerante e de aceitação de todo o tipo de diferenças.
Este desafio também afecta outros familiares. Por isso é importante falar com os familiares mais próximos, educadores e amigos da família, comunicando quais são as necessidades da criança e o que se espera deles.
            As crianças que são verbalmente ou fisicamente agredidas pelos seus pares ficam muitas vezes assustadas ou sentem-se demasiado envergonhadas para falar do assunto. O ideal é que a criança conte o que se passa com ela, no entanto, ela nem sempre irá expressar o que sente. É necessário estarmos atentos a possíveis sinais que possam indicar que ela está com problemas. Estes sinais incluem o negar-se a ir à escola, não querer sair de casa, queixar-se de dores e sintomas sem causa física e, chorar excessivamente ou sem motivo aparente.
            Jamais se deve culpar a criança, a si mesmo ou ao seu companheiro(a). Os comportamentos de género variantes são o produto de como a natureza criou a criança. Estas características não foram causadas pelos pais e não podem ser modificadas por ninguém. De facto, ao preocupar-se em que a criança mude vai estar a perder a oportunidade de desfrutar da própria infância da criança e, simultaneamente, perder-se-ão a longo prazo as recompensas de uma atitude de afirmação e aceitação por parte dos pais. De facto, a pressão social apenas leva a que a criança esconda os seus interesses e a suprimir a sua espontaneidade. Isto intensifica-se se a criança acreditar que deve ser diferente do que é para ser aceite e querida pelos seus pais. Ao pressionar, os pais comunicam que é preferível atuar de uma maneira que não é natural, do que ser autêntico e coerente consigo mesmo.
O ser diferente não valida a intolerância baseada em preconceitos. Não se deve reprovar a criança pela crueldade dos outros, pois ninguém merece ser maltratado. Quando se souber de um ato de agressão dirigido à criança é importante averiguar o que se passou e ajudar a criança a planear como responder no futuro.