5 de fevereiro de 2016

Género(s)



“Com palavras e atos nos inserimos no mundo humano, realizando um segundo nascimento, no qual confirmamos e assumimos o fato original e singular do nosso aparecimento físico.”
Hannah Arendt
Filósofa alemã

Estudos recentes apontam para os efeitos dos androgénios fetais na organização cerebral de um padrão sexual e, também, no facto da testosterona afetar os neurónios cerebrais que contribuem para a masculinização do cérebro, em áreas como o hipotálamo.
            Antes dos três anos de idade, as crianças desenvolvem interesses e preferências que são típicas do seu género. Numa etapa seguinte, sensivelmente aos cinco ou seis anos de idade, elas são já capazes de reconhecer os comportamentos de género, tanto os que são típicos para cada um dos sexos como os que não são. No entanto, algumas crianças desenvolvem-se de forma diferente, possuindo interesses que são considerados típicos do outro sexo e, por vezes, preferem a aparência e atuam como se fossem do outro sexo. Estas condutas designam-se por comportamentos de género variantes, visto serem condutas que variam da expectativa social para cada género. As crianças com comportamentos de género variantes demonstram interesses e preferências que não se adaptam às normas culturais usualmente aceites para cada um dos géneros.
            Quando, nalguns casos, estes comportamentos de género variantes ocorrem de forma generalizada, marcada e persistente, pode-se concluir que o sujeito possui um padrão de comportamentos de género variantes que se justifica no seu interesse intenso e constante há já alguns anos. Todavia, as condutas que se observam com maior frequência têm tendência a tornar-se cada vez menos frequentes, uma vez que a criança interage mais com os seus pares no ambiente da escola. Esta diminuição dos comportamentos observados pode indicar que, à medida que matura e experimenta a crítica dos seus pares, a criança suprime algumas condutas ou dissimula para passar desapercebida. Por volta dos cinco/seis anos de idade, as crianças começam a ser mais influenciadas pela pressão social para se ajustarem aos esquemas de género convencionais. Esta pressão leva-as a modificar a aparência dos seus comportamentos para se adequar às expectativas sociais. A existência de comportamentos aparentemente diferentes não reflete necessariamente uma mudança no estado psíquico interior da criança.
Os comportamentos de género estão principalmente determinados pelos genes, ou seja, a predisposição genética faz com que os comportamentos de género fiquem “impressos nos circuitos” do cérebro antes ou pouco depois do nascimento. Obviamente o conteúdo específico dos papéis masculinos e femininos deve ser aprendido por todas as crianças, mas aquelas que variam nos seus comportamentos de género parecem estar biologicamente predispostas a assumir aspectos dos papéis típicos do outro sexo.
            Nesse sentido, é importante salientar que os comportamentos de género variantes não são causados pela forma de atuar dos pais ou por acontecimentos da infância, nem por patologia mental ou conflito psicológico. No entanto, devido à pressão social, estas crianças tendem a experimentar rejeição, críticas e maus-tratos, o que predispõe o surgimento de dificuldades psicológicas.
            Como adolescente e adulto, o sujeito que desenvolve um padrão de comportamentos de género variantes pode sentir-se emocional e fisicamente atraído por pessoas do sexo oposto, do mesmo sexo ou de ambos os sexos. Mesmo que estas três hipóteses sejam possíveis para qualquer criança, estudos de investigação que têm observado, por exemplo, o desenvolvimento de meninas com comportamentos de género variantes até à idade adulta revelam que, como adultas, a maioria delas têm uma atração física e afetiva por pessoas do seu sexo. Por outro lado, algumas meninas que têm rasgos identificativos de uma psique atitudinal masculina passam a ser adultas convencionalmente femininas. Outras, mantêm na idade adulta atitudes e interesses masculinos em maior ou menor grau.
            É importante referir que, caso subsista a pressão externa dos pais, professores e técnicos, não é capaz de modificar as características de identidade sexual essenciais da personalidade, uma vez que o temperamento e outras características profundas da identidade do sujeito são preestabelecidos e visíveis numa estrutura psíquica organizada desde a primeira infância. Além disso, esta dinâmica profundamente antipedagógica será necessariamente interpretada pela criança / jovem como um acumular de humilhações que, consequentemente, destruirá a confiança em si mesma e afetará gravemente a sua autoestima. 

Obs.: O presente artigo terá continuidade na próxima edição do JBG




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