5 de junho de 2012

O impacto do divórcio nas crianças e a alienação parental




Há bastantes anos, o desafio que se colocava sobre os filhos dos pais divorciados era o receio de que a circunstância intrínseca de ter os pais separados os atirasse para uma espiral de infelicidade, de rebeldia e de falta de valores familiares. Hoje em dia, este mito foi ultrapassado e progressivamente assistiu-se a uma assimilação social e jurídica do divórcio, simplificando-o e desburocratizando o processo, eliminando até a noção de culpa das partes. No fundo, permitindo que quando o casamento não cumpre as funções pretendidas, os cônjuges se possam libertar e evitar conflitos desnecessários.
Nos casais com filhos a simplificação do divórcio não tem impacto pretendido porquanto a regulação das responsabilidades parentais acarreta a necessidade de um entendimento entre os pais, para benefício dos filhos, e esse acordo nem sempre é conseguido pela via extrajudicial.
Aquando da consumação da separação dos progenitores da criança, a lei portuguesa estabelece que se deve proceder à regulação das responsabilidades parentais. Entende-se por responsabilidades parentais a capacidade de partilhar as tarefas da parentalidade, bem como à definição da guarda de facto das crianças e a regulação do convívio com o progenitor com quem a criança não coabita.
A guarda conjunta ou a responsabilidade parental partilhada é, ainda hoje, residual. No início dos anos 80, nos Estados Unidos da América foi considerado sexista atribuir a guarda dos filhos à mãe. Na verdade, em Portugal, apesar de algumas tentativas, essa ainda é a tendência dominante, em caso de dúvida ou de igualdade de condições. Por outro lado, a noção de culpa no divórcio (só recentemente removida) foi permitindo que este se transformasse numa disputa com vencedor e vencido. Os filhos têm vindo a fazer parte das negociações e chantagens que se dão na divisão de bens, de forma sistemática. É geralmente nestes quadros pós-divórcio, em que os pais confundem o seu conflito com o papel parental que desempenham, que muitas das tarefas da parentalidade se vêm comprometidas.
 Steinemann (1983) divide os casais em fase de separação em 3 grupos: O grupo A diz respeito aos “pais com sucesso” que conseguem separar claramente o seu conflito conjugal do seu papel parental e que desejam proteger os filhos do sofrimento, não os imiscuindo no processo de separação. Os pais do grupo C são “pais que falham”, oriundos de famílias já bastante desorganizadas antes da separação, com confusão de papéis e que na sua maioria vão envolver completamente os filhos no processo de separação. O grupo B (onde se situam a maioria das situações) é o dos “pais desorientados e ambivalentes”, isto é aqueles que se encontram sob um nível de stress muito elevado e que, não sabendo exactamente as decisões que devem tomar, beneficiariam do apoio da família alargado e de profissionais.
Aquando do divórcio dos pais, as crianças tendem a manifestar alguma rejeição parental, considerada adaptativa face ao processo de reestruturação familiar e que geralmente é transitória. Alguns exemplos disso são ansiedade de separação, desagrado face aos novos companheiros dos pais e dos filhos destes, desagrado face às regras mais rígidas na casa de um dos progenitores, desagrado pela necessidade de alternar entre casas, entre outros. Todavia no caso de conflitualidade elevada entre os progenitores o risco psicológico torna-se maior, quer a curto quer a médio e longo prazo e é aqui que se inscreve, do ponto de vista fenomenológico, a Alienação Parental.
No âmbito dos divórcios conflituosos, a Alienação Parental surge como a criação de uma relação exclusiva entre o progenitor que tem a guarda e a criança no sentido de afastar o outro progenitor.  Este fenómeno foi descrito pela primeira vez por Gardner nos anos 80, mas parece existir desde que existem divórcios e/ou disputas pela guarda de filhos menores.
Nestas situações começamos por verificar uma recusa inicialmente por parte do progenitor quem tem a guarda em cumprir aquilo que foi combinado ao nível das visitas e dos contactos da a criança com o outro progenitor. Surge também uma campanha de descrédito e injúrias acerca desse progenitor junto da criança. São então utilizados todos os recursos legais para tentar adiar o processo de visitas e pernoitas junto do progenitor que não tem a guarda.
Com o evoluir da situação e se não for adequadamente a criança começa a interiorizar este processo e começa a ser ela própria a denegrir o progenitor e a não querer passar tempo com este.
Geralmente este processo atinge o seu expoente máximo quando surgem acusações falsas de abuso sexual e estas dão entrada em tribunal com o objectivo de suspender definitivamente as visitas.
Este processo levado a cabo por progenitores que instrumentalizam as suas crianças como forma de atacar o ex-cônjuge tem um forte impacto nas crianças. No curto prazo predomina a ansiedade de separação, a identificação patológica com o progenitor alienador, regressões no desenvolvimento, passando por um empobrecimento da vida social, com défices de auto-estima e no controlo dos impulsos e baixo nível de resistência à frustração. A longo prazo, os efeitos não foram ainda suficientemente estudados mas os relatos de adultos que foram vitimizados por este fenómeno quando crianças são, no mínimo, inquietantes.
Concluindo, e para impedir que estas situações se materializam e consolidem como conflitos permanentes, estes sim traumatizantes, será importante que muitos dos pais desorientados e ambivalentes procurem o apoio da mediação familiar, antes de tornarem patológico o processo de regulação das responsabilidades parentais. A intervenção atempada de técnicos com a formação adequada poderá reverter o processo e impedir que a alienação parental se concretize.
Como vimos inicialmente, existe uma linha ténue, entre aquelas famílias que perante a situação de crise conseguem organizar-se, com o aconselhamento profissional, na defesa da melhor situação para a criança, e aqueles que se envolvem num conflito que muitas vezes dura o resto das suas vidas, invertendo valores e princípios que até aí tinham sido defendidos para a educação da criança, numa lógica de “faz o que eu digo e não faças o que eu faço”.
Agora o desafio que nos colocamos tem um novo enfoque colocado na capacidade de gestão desse divórcio e da capacidade dos progenitores manterem uma ideia de educação e de princípios para os filhos que vão para além do seu próprio relacionamento enquanto casal. A evolução, do ponto de vista do amadurecimento do casal, para esse estádio pós-divórcio, é decisiva para a qualidade da infância e da juventude.


Promo // Documentário sobre a Alienação Parental em Portugal: http://vimeo.com/12489169