28 de abril de 2008

Caminhos

Já posso partir! Que os meus irmãos se despeçam de mim!
Saudações a todos; começo minha partida.
Devolvo aqui as chaves da porta e abro mão dos meus direitos na casa.
Palavras de bondade é o que peço a vocês por último.
Estivemos juntos tanto tempo mas recebi mais do que pude dar.
Eis que o dia clareou e a lâmpada que iluminava o meu canto escuro se apagou.
A ordem chegou e estou pronto para a minha viagem. (Tagore, Gitanjali, XCIII)


Eis que surge o tema de que ninguém quer falar. Eis que surge o objecto de preocupação de muitas mentes pelo mundo fora. Única certeza de um ser vivo. A morte é a palavra temida mas que é necessário usar. Porque poucos são os artigos alusivos ao tema e porque é necessário informar e ajudar quem trata e quem padece em silêncio.
Da necessidade da prestação de determinados cuidados ao longo da última caminhada terrena surge a preocupação com a intervenção fornecida. Deveremos falar com o doente sobre o assunto, deveremos mudar de assunto e procurar actividades como forma de distracção, o doente deverá ter conhecimento total acerca do que se passa consigo?
São muitas as questões que se colocam às famílias no momento em que a noticia atinge o coração familiar.
Elisabeth Kübler-Ross no seu livro Sobre a Morte e o Morrer foca algumas fases pelas quais o indivíduo passa após a recepção da notícia. Devemos entender que estas fases referem-se a aspectos psicológicos que interferem no bem-estar da pessoa, família e até mesmo no tratamento podendo, consoante a atitude positiva ou negativa do sujeito, ser um facilitador ou obstáculo ao seu tratamento. Também acontece alguns indivíduos não passarem por todas as fases saltando algumas ou ficando presos a uma delas.
Segundo Kübler-Ross a primeira fase pela qual os pacientes passam é a fase da negação da doença e o isolamento. Reacção ao choque inicial passa por não querer aceitar a doença e o que a acompanha. A segunda fase é uma fase de revolta, com a aceitação da doença surge a raiva o individuo pergunta-se porque foi ele e porquê naquele momento. Com a terceira fase surge uma nova forma de vida, o indivíduo já aceitou parcialmente a doença e vai tentar ser mais prestável aos outros, como se dessa forma o “castigo” a que foi confinado seja levantado. Com a quarta fase vem a depressão quando o indivíduo não consegue mais esconder e esconder-se da sua doença toda a sua raiva e alheamento dão lugar a um sentimento de grande perda. Com a quinta fase surge a aceitação, esta é a fase onde termina a luta, aceita-se a doença, surge finalmente uma temporada de paz e serenidade.
A doença terminal é um processo complexo que deve ser tratado com todo o cuidado e atenção. O respeito é sem dúvida, o melhor instrumento para quem lida com os indivíduos que têm de enfrentar esta notícia.
Melhor que ninguém, o indivíduo sabe como se sente e quais as formas de o fazer sentir-se melhor. Caso seja necessário, é aconselhável que as rotinas familiares sejam minimamente alteradas. Deve ser proporcionado um ambiente seguro e estável ao nível emocional e social, para isso, deve saber sempre o que está a acontecer ao seu redor de forma a que poucos sejam os momentos de ansiedade. É então necessário algum cuidado sobre a forma como, no quotidiano é encarado o facto de ter a morte sempre presente. Fingir que nada está a acontecer poderá não ser a melhor solução, pois apesar de doloroso deve ser encarado e tratado. É frequente tentarmos animá-lo, distraí-lo e incitá-lo a fazer coisas que não o façam pensar na notícia. Mas ele necessita de tempo de reflexão e tristeza. É de extrema importância que esse espaço seja facultado. Só com estes momentos de reflexão é que o individuo pode elaborar e pensar a doença e o que o espera. Assim, devemos tentar apoiá-lo com a maior naturalidade e tranquilidade possíveis.
A esperança é outro factor a ter em conta visto que acompanha a pessoa e a família até ao fim. É um factor que tem de ser bem gerido pois da mesma forma que pode ser um facilitador no tratamento, pode ser um factor de oposição, em que o indivíduo perde a esperança, fica prostrado sem vontade de lutar, toda esta situação dificulta os tratamentos necessários.
A despedida de um ente querido é sempre muito dolorosa tanto para o próprio como para a família e amigos. Assim sendo, espaço, tempo, corpo e personalidade da pessoa têm que ser respeitados. Acima de tudo, o respeito fornece o melhor caminho para gerir o sofrimento.

NEIP – Núcleo de Estudos e Intervenção Psicológica psivrsa.blogspot.com
(Dorisa Peres, Eduardo Coelho-Moos, Fabrícia Gonçalves, Patrícia Santos, Pedro Costa, Sílvia Cardoso, Sofia Ferreira, Susana Sousa, Teresa Moos) psivrsa@gmail.com
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